O volume nas salas de parto das maternidades paulistas está acima do recomendado pela Organização Mundial da Saúde (OMS) e Associação Brasileira de Normas Técnicas (ABNT). O som alto, segundo especialistas ouvidos pelo Jornal da Tarde, provoca alterações fisiológicas na mulher e no recém-nascido, como o aumento da pressão arterial, frequência cardíaca, produção de adrenalina, contrações musculares e estresse – o que torna o procedimento mais trabalhoso e os partos naturais ainda mais dolorosos.
O nível de ruído médio, em cerca de 80 partos, medido pela enfermeira-obstetra Clara Fróes de Oliveira Sanfelice foi de 65 decibéis (dB). “Mas em algumas situações o aparelho (decibelímetro, o mesmo utilizado pela Prefeitura de São Paulo para medir o nível de ruído em casas noturnas e bares pelo Programa de Silêncio Urbano – PSIU]) acusou 103 decibéis”, completa Clara, mestranda do Departamento de Enfermagem da Faculdade de Ciências Médicas, da Universidade Estadual de Campinas (Unicamp).
Todos os sons registrados dentro das salas de parto, como equipamentos, movimentação e conversas de enfermeiros, médicos e familiares das gestantes, foram levados em consideração para aferir o nível de ruído. “Apesar de não existir limite específico para salas de parto, a ABNT estabelece em 45 decibéis o máximo de ruído em centros cirúrgicos, enfermarias e berçários”, diz Alessandra Samelli, professora de Fonoaudiologia da Universidade de São Paulo.
No entanto, ela explica que por uma questão matemática, o som pode ser ainda mais alto. “Os decibéis são medidos em logaritmos. A proporção não é aritmética de um para um. A literatura fala que a cada 6 decibéis a intensidade sonora triplica. Uma medição de 15 decibéis, significa uma ‘sensação auditiva’ de 45 decibéis”, diz Alessandra, que dirige a Associação Brasileira de Audiologia (ABA).
O volume alto é prejudicial para bebês, mães e profissionais da saúde envolvidos no parto, diz Marcelo de Toledo Piza, diretor da Associação Brasileira de Otorrinolaringologia e Cirurgia Cérvico-Facial (ABORLCCF). “O recém-nascido ainda não tem o sistema auditivo maduro o suficiente para suportar níveis altos. Porém, não há risco de surdez, pois o tempo de exposição é curto. Mas há outras implicações negativas. ”
O barulho pode ocasionar alterações fisiológicas na criança e na mulher, como “aumento da pressão arterial, frequência cardíaca, respiratória e da produção de adrenalina e cortisol hormônios relacionados ao estresse”, lista Maria Esther Jurfest Ceccon, pediatra e chefe da Unidade de Cuidados Intensivos Neonatais do Instituto da Criança do Hospital das Clínicas.
Alterações que podem dificultar ainda mais o trabalho de parto. “Nas mulheres, o barulho também é responsável por contrair a musculatura e diminuir a movimentação gastrointestinal, dificultando o parto. Se a mulher não relaxa, o procedimento é ainda mais doloroso”, diz Antonio Fernandes Moron, professor titular do Departamento de Obstetrícia da Escola Paulista de Medicina, da Universidade Federal de São Paulo (Unifesp).
Para quem passou pela experiência de um parto, o silêncio colabora, sim. “Foi muito tranquilo porque o ambiente estava confortável: luz baixa, pouco barulho e gente na sala”, conta Lígia Botelho dos Santos, de 28 anos, que há 16 dias deu à luz Ester. “A situação já é estressante. Qualquer coisa para diminuir a tensão é válida.”
Segundo Alessandra, médicos e enfermeiros também estão suscetíveis ao impacto negativo do som alto. “A concentração fica comprometida. devemos considerar que eles estão expostos por muito mais tempo, o que pode potencializar problemas cardiovasculares e gastrointestinais.”